Recentemente saiu o boato que o Presidente da República teria enviado ao STF um pedido de decretação de Estado de Sítio. Mas não foi isso o que aconteceu.
Antes de explicar os detalhes do que realmente está para ser pautado pelo STF, a pedido do Presidente da República, vamos entender o que é Estado de Sítio e, a partir de então, detalhar se seria bom ou ruim, neste cenário pandêmico de Covid.
Consta na Constituição Federal que, em determinados casos excepcionais, a União poderá decretar Estado de Sítio, após alguns procedimentos que eu já vou detalhar.
Então, primeiramente, não é só o presidente querer decretar e pronto.
Para que surja um Estado de Sítio, inicialmente, o Presidente teria que convocar o Conselho da República, para se manifestasse sobre o Estado de Sítio, (art. 90, I, da Constituição Federal). Com a resposta do Conselho da República, enviar o pedido de aprovação do Estado de Sítio ao Congresso Nacional a fim de que este apreciasse a demanda, podendo autorizar ou não (art. 49, IV, da Constituição Federal), para só então, depois da autorização concedida, o Presidente da República, através da União, finalmente, decretar o Estado de Sítio (art. 84, IX da Constituição Federal).
Percebam que, neste caso, não há participação do judiciário para início de Estado de Sítio, apenas do executivo no papel da União e do legislativo através do Congresso Nacional.
Uma das hipóteses de decretação de Estado de Sítio, e a única cabível, em virtude da pandemia, caso o Presidente a quisesse seguir, seria embasada na primeira parte do art. 137, I da Constituição Federal:
Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de:
I - comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;
Ou seja, em virtude da pandemia, que está gerando consequências de grave repercussão nacional, poderia, em tese, ser iniciado o procedimento para um Estado de Sítio.
Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento no art. 137, I, só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas:
I - obrigação de permanência em localidade determinada;
II - detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns;
III - restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei;
IV - suspensão da liberdade de reunião;
V - busca e apreensão em domicílio;
VI - intervenção nas empresas de serviços públicos;
VII - requisição de bens.
Como é possível perceber, o Estado de sítio impõe limitações a alguns dos direitos e garantias individuais, por um prazo determinado, para que seja estabelecida a ordem, concentrando os poderes de decisão na Presidência da República.
Na prática, ao meu ver, ainda que fosse decretado Estado de Sítio, não mudaria muita coisa para nós indivíduos. Como assim?
A obrigação de permanência em localidade determinada já está colocada, ainda que de forma não totalmente restritiva. Mas o “fique em casa” já transmite uma mensagem bem clara: Não é pra sair de sua residência.
Não diria que já estão ocorrendo violações ao sigilo das comunicações, ainda. Mas, vejam bem, os governos Estaduais já usam o controle das redes de transmissão de dados celulares para saber onde existem focos de aglomeração e enviar a polícia para dispersar.
Esta medida, por si só, tem se mostrado eficiente para encontrar as aglomerações clandestinas. Então, não vejo muito sentido em violar a comunicação em si das pessoas, ao menos não como medida de evitar a dispersão do Covid.
A requisição de bens já ocorreu no início da pandemia no Brasil. Há aproximadamente um ano, quando alguns Estados e Municípios pegaram equipamentos hospitalares das empresas, como luvas, máscaras, gases, etc., para evitar o colapso da rede pública. Mas atenção, requisição não é confisco! O que foi requisitado deve ter o valor devidamente pago pelo ente federado.
As outras limitações individuais não me parecem aplicáveis ao cenário de Covid.
Vi algumas pessoas fazendo cenário apocalíptico, mas não vejo como o Presidente, seguindo a Constituição Federal, poderia deixar as coisas “piores” do que já estão, no sentido de restringir ainda mais os direitos das pessoas.
Poderia, talvez, acontecer justamente o oposto. Como a decisão de restrições estaria concentrada nas mãos do Presidente, e sabe-se que desde o início o Presidente defendeu o Lockdown apenas para grupos de riscos, então, talvez, os Lockdowns decretados pelos Estados e Municípios perdessem a eficácia.
Pra dizer que estão roubando a competência dele!
Como falei anteriormente, o que estamos vivendo já é um Estado de Sítio “mitigado” chamado de Locdown. Mas não há previsão constitucional para isso!
A Constituição estabelece os direitos e garantias individuais. Dentre eles está o trabalho, por exemplo. Quando um decreto Estadual ou Municipal limita o comércio para atividades essenciais, está, na prática, limitando um direito individual, que é do cidadão, de trabalhar.
Mas, constitucionalmente, quem pode fazer isso – flexibilizar direitos e garantias – é o Presidente da República, nos casos de Estado de Defesa ou de Estado de Sítio. Então, na visão do Presidente, e na minha visão como jurista, o que está acontecendo no Brasil é de uma inconstitucionalidade sem limites, pois todo poder parece estar concentrado nas mãos dos Governadores.
Há Municípios que não veem necessidade de decretar Lockdown. Mas os Ministérios Públicos ingressam na justiça para obrigar o Município a ceder às pressões dos Estados (procurar caso do MT).
Falando do STF, sim, tudo pode ser distorcido e ser “entendido” conforme a vontade da Corte Suprema.
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